NOTICIAS03/12/2025

Falece servidor do TRF-3 vítima de teste de aptidão física imposto por administrações à revelia da lei

Por: Luciana Araujo
Sintrajud exige suspensão definitiva da prova que coloca em risco as vidas de servidores do Judiciário Federal e ingressantes na categoria.
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Após 23 dias internado, o agente da Polícia Judicial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região Antônio Roberto Marques foi a óbito nesta quarta-feira (03 de dezembro). O servidor de 58 anos de idade teve duas paradas cardiorrespiratórias - uma durante e outra após o teste de aptidão física (TAF) anual exigido pelo Tribunal. Há anos o Sindicato e agentes questionam a imposição do teste como condição para o recebimento da gratificação por atividade de segurança (GAS).

Antônio deixa a irmã, Cristina, sobre quem diversos colegas relataram ter presenciado o amor incondicional ao irmão. "Uma fortaleza cheia de fé e consciente de que, após o ocorrido, foi feito tudo conforme a vontade dele", relatou à reportagem o agente Cláudio Antônio Klein, ex-dirigente do Sintrajud e colega de TRF-3 do servidor falecido.

Entre os relatos à reportagem do Sindicato, muitas lembranças de como ele amava cachorros e era cuidadoso com os servidores e servidoras que com ele trabalhavam, levando bolos e pães de queijo.

"Era um bom agente. Trocavam os desembargadores e ele ficava no mesmo gabinete. Quando o vi naquela cama, o sentimento que aflorou em mim, e em cada um de nós fomos visitá-lo, é que ali poderia ser qualquer um de nós, porque estamos submetidos aos mesmos absurdos  impostos por administrações que às vezes parecem que nos desprezam. A gente precisa pensar mais em nós mesmos como colegas, pois no fim das contas somos todos Antônios", complementa Klein.

A diretoria do Sintrajud lamenta a morte do colega e refirma a exigência de suspensão definitiva desse teste. Requerimento do Sindicato foi apresentado a todos os tribunais superiores e foi solicitada também reunião com o secretário-geral do Conselho da Justiça Federal, juiz Erivaldo Ribeiro dos Santos, para tratar do tema com a urgência necessária. A pedido da entidade o TRF-3 suspendeu os testes marcados para a semana na qual Antônio sofreu o mal súbito, mas as normativas que impõem a prova seguem em vigor, embora a Lei 11.416/2006 exija apenas participação em cursos anuais de reciclagem. As administrações, no entanto, além de imporem o TAF, vincularam o pagamento da GAS à realização do mesmo, o que virou ameaça de perda salarial e pressão para que os agentes realizem o teste mesmo sem um programa de condicionamento físico e saúde preventiva assegurado pelos tribunais.

Os agentes do TRF-3 vão prestar a última homenagem a Antônio durante as cerimônias fúnebres nesta quinta-feira (04 de novembro). O verlório de Antônio acontece a partir das 7 horas no Espaço Abcel, que fica na Av. Pres. Kennedy, 625, bairro Santa Paula, na cidade de São Caetano do Sul, e é aberto a todas as pessoas que queiram estar presentes. Às 11 horas, o corpo será trasladado ao município de Jacareí, onde será realizada a cremação, em ato fechado.

Ameaça à vida

A revolta contra o TAF se avolumou no Tribunal diante das mortes de Antônio e de Edilson Ferreira Lustosa, morto no dia 08 de novembro, aos 56 anos de idade, após passar mal durante a prova de corrida integrante do concurso para a função de APJ do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. "Esse é um teste que não avalia nada, não serve para nada além de lesionar,ou causar uma desgraça como a que ocorreu. Nunca fiquei sabendo de ninguém que melhorou o trabalho feito no Tribunal - na segurança, transporte ou mesmo junto aos desembargadores. Acaba sendo somente um meio de punição, coisa que não ocorre em nenhuma outra função", desabafou um servidor do TRF que trabalhou com Antônio.

Outro servidor questionou que nem mesmo agentes das polícias civil, militar ou federal são obrigados, por exemplo, a cumprir provas que incluem corridas de mais de um quilômetro.

"Conheci Antônio no Tribunal. Morávamos no mesmo bairro e trabalhamos juntos por um período, o que nos aproximou. Depois que ele foi trabalhar em gabinete o contato ficou menos estreito, mas sempre que nos encontrávamos no bairro ou no Tribunal nos últimos 18 anos sempre trocávamos algumas palavras. O acontecido com Antônio traz uma sensação de que estamos desamparados e a administração não tem o menor respeito para a categoria dos Agentes da Polícia Judicial. A sensação de que qualquer um de nós poderia estar no lugar dele", relatou outro colega.

"Antônio era muito reservado, mas sempre que nos víamos trocávamos ideias. Era muito informado de nossas demandas e muito pragmático quanto a nossa situação de Polícia Judicial. Era contra que nos expuséssemos sem que antes as administrações nos dessem as garantias de lei que essa carreira necessita. O TAF é um desses absurdos que nos impõem goela abaixo, sem previsão legal, sem nenhuma função específica, dando a impressão que se trata apenas de um procedimento punitivo. Nenhum de nós pode abrir mão da GAS, que está vinculada à realização deste teste. O sentimento de revolta que sentimos com a tragédia de Antônio é que além de que poderia ser qualquer um de nós, ele era um dos que sempre se posicionou contra absurdos desse tipo. Não podemos mais aceitar essa imposição, que outro colega passe por isso novamente", conclui Klein.

"A morte de Antônio evidencia como é fundamental fundamental a luta pela desvinculação da GAS à realização do TAF. Esta gratificação é uma contrapartida à exposição a riscos que os agentes se colocam no exercício funcional cotidiano e não há previsão legal para condicionar o pagamento da gratificação a esses testes", complementa o diretor do Sintrajud e também agente do TRF Cléber Aguiar.

* Texto alterado às 19h40 para inclusão das informações sobre o funeral.